Um novo filme de Roland Joffé: uma lição e um desafio

O título Encontrarás Dragões é um bom resumo de uma história palpitante de amor e desamor, de uma viagem onde há dragões - os demónios interiores - que assaltam homens e mulheres que procuram a esperança e o sentido da vida num mundo desconhecido, selvagem e inóspito.

Apresentamos um artigo publicado no Diário do Minho

em que o seu autor, Jorge Margarido Correia, analisa o filme

"Encontrarás Dragões":

O título Encontrarás Dragões é um bom resumo de uma história palpitante de amor e desamor, de uma viagem onde há dragões - os demónios interiores - que assaltam homens e mulheres que procuram a esperança e o sentido da vida num mundo desconhecido, selvagem e inóspito.

Acabo de ver mais um grande filme realizado por Roland Joffé (também realizador dos “oscarizados” A Missão e Terra Sangrenta). Chama-se Encontrarás Dragões e narra a história de Josemaria e Manolo. Amigos de infância, a vida une-os e separa-os numa Espanha que se precipita paulatinamente para a Guerra Civil. Ambos partilham o sofrimento da sua revolta contra esta situação, mas vão assumi-la de modo diferente. "Nascemos e morremos sós", diz Manolo com um trágico estoicismo. "Não necessitei de aprender a perdoar, porque Deus me ensinou a amar" dirá anos mais tarde o sacerdote Josemaria Escrivá, fundador do Opus Dei.

Declaração de interesses: pertenço ao Opus Dei há mais de cinquenta anos, quarenta dos quais como sacerdote, e tive o privilégio de conviver quatro anos com S.Josemaria em Roma. Mas precisamente por isso, pertenço a um grupo de pessoas muito difícil de contentar neste tipo de reconstituições históricas, assim como de iconografia representativa de pessoas com quem convivemos e que tanto nos marcaram.

Ora, Roland Joffé deu-me uma boa lição! Usou a ficção (especialmente na figura de Manolo e do seu filho) para poder universalizar as vivências por que foram passando e pôr-nos a todos nós a reflectir sobre o significado da vida e da morte, do ódio e do perdão, do ideal e da barbárie. Mas não manipulou a história em benefício de qualquer ideologia ou preconceito como tantas vezes assistimos por aí.

No entanto, a figura de Josemaria Escrivá, por já ter sido objecto de inúmeras investigações biográficas, diria quase exaustivas, não poderia ser facilmente ficcionável. Tinha por isso o problema de sintetizar ou condensar em imagens de um filme o original da sua vida, pensamento e acção. O que ele conseguiu de um modo genial foi usar, num enredo credível e apreensível, factos, atitudes e palavras realmente vividos.

O actor Charlie Cox representa São Josemaria: "De todos os personagens do filme, Josemaria é o único que existiu históricamente, o único sobre o qual abundam testemunhos e provas" (Roland Joffè)

E se a ficção era necessária para transcender o tema e as personagens, e alcançar-nos a todos, cada um com os nossos “dragões interiores” que nos desafiam, a figura de alguém que soube vencer esses “dragões” e apontar caminhos para nós vencermos, era importante que fosse real, de carne e osso para que fosse, de facto, lugar da esperança. É para isso mesmo que a Igreja eleva aos altares aqueles que pode por como exemplo e mestres para o nosso caminhar.

E por isso, ao dar o “Bem haja” a Roland Joffé pela lição que nos deu, gostaria de lhe lançar um desafio, a ele e à fantástica equipe que soube formar: para quando um filme sobre João Paulo II e os dragões que ele nos animou a combater como o seu “Não tenhais medo”?

Jorge Margarido Correia é Engº Mecânico e Doutor em Teologia