Encarar os problemas a partir do perdão

Apresentamos um artigo de opinião publicado no diário econômico ‘Expansión’, em que o seu autor, Ignacio Valduérteles, analisa o filme Encontrarás Dragões.

Há anos foi moda usar filmes como material didático para a formação de empresários. A ideia não é má em si, mas o abuso que se faz da mesma empobrece os resultados. Há livros que citam centenas de filmes com o fim de ilustrar determinadas áreas da direção de empresas. Não me parece mal, insisto; mas julgo não serem muitos os filmes de que se possam extrair ensinamentos válidos sobre o assunto, e estes raramente fazem referência a tarefas diretamente relacionadas com o mundo empresarial, mas com os valores humanos.

Para citar alguns: Um homem para a eternidade, de Fred Zinnemann, em que se manifesta a serena liderança que se afirma ao manter princípios decididos e firmes. Citizen Kane (Orson Welles), que mostra a futilidade da vida, o valor da simplicidade e a importância de possuir um legado para transmitir às gerações seguintes. O homem tranquilo, de John Ford, que contrapõe dois modelos de liderança: um agressivo, fanfarrão e descontrolado; o outro de uma enorme energia contida e certeira, que só se manifesta nos momentos certos. Filmes, enfim, que têm pouco a ver com a gestão empresarial.

A estes acrescento um que vem na mesma linha: Encontrarás Dragões, de Roland Joffé. Nada mais afastado do mundo empresarial, em princípio, que o argumento deste filme, com duas histórias paralelas, duas formas de encarar a vida, de dois protagonistas, nos tempos difíceis da Guerra Civil espanhola. Um, São Josemaria, encara-os do ponto de vista do perdão; o outro, Manolo Torres, do lado do rancor. O primeiro tem consciência de que o perdão não pode recuperar o passado, mas prepara um futuro melhor. O segundo encerra-se nos seus rancores que o levam a um beco sem saída.

Na vida empresarial, como em qualquer outro ambiente, encontram-se dragões, sob a forma de fracassos, traições ou revezes. O que distingue uns empresários de outros é a forma de os abordar. Há os que, face a um problema, antes da solução procuram o culpado real ou fictício em quem descarregar a frustração. Incapazes de reconhecer as suas limitações, ou as que as circunstâncias impõem, revoltam-se contra tudo e contra todos, atolando-se, cada vez mais, no seu fracasso. Nunca foram capazes de enfrentar as dificuldades da vida. Não têm recursos para encarar o sofrimento, a adversidade. Não entendem que o importante não são os fracassos – inevitáveis –, mas sim a forma de os enfrentar e que isto exige uma fortaleza interior considerável que se adquire com o exercício quotidiano dos valores pessoais, aquilo a que Aristóteles chamava virtudes humanas.

Mas há mais. O filme fala da liberdade de escolha que caracteriza as pessoas. O empresário é totalmente livre de tomar as decisões que entender como melhores, mas em cada caso deve assumir também a responsabilidade das consequências que daí advierem. Essa é a grandeza da liberdade. E uma última lição: estar permanentemente centrado nos outros, nos seus skateholders, para usar a gíria empresarial. Em palavras do realizador, Roland Joffé, «o vazio que a ausência do amor deixa é preenchido com o medo, o ódio e o desespero». Em termos empresariais: ou estou atento aos clientes e fornecedores, mudando até o organograma e os métodos se for necessário, ou esses clientes e fornecedores se tornam inimigos a quem temos de temer.

Há mais ideias aproveitáveis: a direção como serviço em contraponto à direção como simples detenção do poder, o respeito pelos outros, ainda que as suas opiniões divirjam das minhas; a capacidade de construir, que não humilha mas que torna grandes os diretores; a importância de propor objetivos e trabalhar por eles, e algumas mais.

Um detalhe curioso. Vi bastantes críticas sobre o filme, quase todas utilizam o sistema de estrelas – já sabem, de uma a cinco – e avaliações intermédias; a maioria são de cinco estrelas e as que o não são, só o avaliam com uma. Quer dizer: um filme que não deixa ninguém indiferente.

Se é empresário vá vê-lo. É mais barato que um MBA e dar-lhe-á muitas pistas para a direção do seu negócio.

(Ignacio Valduérteles é Presidente de IVB Abogados y Economistas)

Ignacio Valduérteles

Expansión