Jesus era discípulo de São João Batista?

Um vez que a relação entre João Batista e Jesus foi tão direta e intensa, caberia perguntar se houve entre eles uma relação de mestre-discípulo.

Pregação de São João Batista (Pier_Francesco_Mola)

Para obter uma resposta satisfatória à essa pergunta, é preciso explicar os três aspectos deste tema que têm sido debatidos pelos estudiosos: o discipulado de João, o alcance do seu batismo no Jordão e os elogios feitos por Jesus ao Batista.

1. Os discípulos de João. Os evangelhos referem com frequência que João possuía discípulos, alguns dos quais o deixaram para seguir Jesus ( Jo 1, 35-37).Não eram, pois, simples seguidores eventuais: acompanhavam-no, seguiam-no e provavelmente compartilhavam o seu modo de vida ( Mc 2, 18) e as suas idéias (Jo 3, 22). Flávio Josefo distinguia duas classes de partidários: uns escutavam atenciosamente João falar da virtude, da justiça e da piedade, e batizavam-se; outros “reuniam-se em torno dele porque se inflamavam muito ao ouvi-lo falar" (Antiquitates iudaicae, 18, 116-117). Houve entre os seguidores de João quem perguntasse ao mestre se Jesus não se mostrava como um rival devido a sua conduta ( Jo 3, 25-27). Não consideravam, portanto, Jesus como um dos seus.

2. O Batismo de Jesus. Os especialistas não duvidam da historicidade do fato, entre outras razões, porque a sua inclusão nos evangelhos levantava algumas dificuldades: em primeiro lugar, a possível interpretação de que o Batista fosse superior ao batizado, Jesus; depois, poderia sugerir que Jesus tinha consciência de ser pecador, visto que o batismo de João era um batismo de penitência. Os sinópticos deixam claro que João reconhece-se inferior: recusa-se a batizar Jesus (Mt 3, 13-17) e a voz do céu revela a dignidade divina de Jesus (Mc 1, 9-11). O quarto evangelho, que não narra o batismo, indica que o Batista dá testemunho de ter visto a pomba pousar sobre Jesus (Jo 1, 29-34) e da sua própria inferioridade (Jo 3, 28). Contudo, não se pode deduzir a partir disso que Jesus foi discípulo de João Batista. Se os evangelistas não especificam que Jesus foi discípulo de João, é porque não o foi.

3. Os elogios de Jesus. Há duas frases de Jesus que revelam a sua estima pelo Batista. Uma delas é recolhida por Mateus (Mt 11, 11) e Lucas (Lc 7, 28): “não surgiu entre os nascidos de mulher ninguém maior que João Batista". A outra frase está em Marcos (9, 13) e aplica ao Batista a profecia de Ml 3, 23-24: “Elias virá primeiro e restabelecerá todos as coisas (...). Entretanto, eu vos digo – afirma Jesus – que Elias já veio e fizeram dele o que quiseram, segundo está escrito a respeito dele". Não há duvida de que a pessoa de João, seu batismo (cfr. Mt 21. 13-27) e a sua mensagem estiveram muito presentes na vida de Jesus. Mas Jesus seguiu um caminho totalmente diferente: na sua conduta, pois percorreu todo do país, a capital Jerusalém e o âmbito do Templo; em sua mensagem, uma vez que pregou o reino da salvação universal; em seus discípulos, aos quais instruiu no mandamento do amor acima das práticas legais e até das práticas ascéticas. O que mais chama a atenção, contudo, é que Jesus abre o horizonte da salvação a todos os homens de todas as raças e de todos os tempos.

Em resumo, não se pode dizer que Jesus teria recebido uma influência decisiva dos seguidores do Batista no suposto pouco tempo que teria passado com eles (a própria ideia de que Jesus teria convivido com os seguidores de João é pouco provável e ainda não comprovada). Jesus, mais que discípulo, foi o Messias e Salvador anunciado pelo último e maior dos profetas, João Batista.

BIBLIOGRAFIA

GNILKA, Joachim. Jesús de Nazaret. Mensaje e historia. Barcelona: Herder, 1993

PUIG, A. Jesús. Una biografía. Barcelona: Destino, 2005.

Santiago Ausín