A dois euros por hora

O Clube Juvenil Neveros, de Madrid, organiza uma original campanha de solidariedade em favor das famílias atingidas pelo terremoto de El Salvador

Com 1536 horas de estudo pode-se construir uma casa

Primeiro, silêncio. Logo, murmúrios. Finalmente, os passos, as vozes e os risos de dezenas de jovens enchem a sede do Clube Juvenil Neveros, de Pozuelo de Alarcón (Madrid). São seis horas da tarde, e os jovens vêm fazer seus deveres e estudar. Mas às suas obrigações de estudantes se somou agora um novo entusiasmo: contribuir com a reconstrução de El Salvador depois dos terremotos do último mês de janeiro, um desastre natural que destruiu mais de 92.000 residências e atingiu, no total, um milhão de pessoas.

A reconstrução de El Salvador é uma causa com a qual, é claro, todo o mundo seria solidário. Mas o que pode fazer um jovem sem recursos e a milhares de quilômetros de distância? Estudar, estudar muito, porque com cada hora investida em estudo se "conseguem" os 2 euros que servirão para levantar casas desmoronadas de famílias salvadorenhas. Um grupo de patrocinadores - empresas e particulares, pais dos sócios do clube e amigos- contribui com o dinheiro que os estudantes vão acumulando com seu esforço diário.

Quando, no último mês de março surgiu a idéia e vários patrocinadores se animaram a financiá-la, a ONG Cooperação Internacional se ofereceu para investir o dinheiro arrecadado. A Cooperação Internacional pôs em andamento um projeto para obter fundos suficientes para construir 500 moradias em dois anos, e os euros que os rapazes de Neveros vão obter serão destinados a esse fundo.

Croqui das casas que se construirão

Cada casa custa onze mil reais (3.000 euros) e tem dois dormitórios, sala de jantar, cozinha e banheiro. Apesar de seu custo reduzido, as casas são estáveis e capazes de abrigar, em 40 metros quadrados, uma família de até sete membros. As residências foram projetadas por professores da Faculdade de Arquitetura da Universidade Católica do Ocidente (Santa Ana, El Salvador), e dali mesmo se encarregarão de gerenciar e coordenar sua construção. O projeto prevê que sejam mais resistentes aos tremores que as casas que foram derrubadas pelo último terremoto.

O dinheiro "obtido" pelos rapazes de Neveros será destinado ao município rural de Coatepeque, um dos mais afetados.

Campo de trabalho na Polônia em julho de 2001

O entusiasmo por cada ladrilho

Dois euros por hora. A quantia realmente só dá para um ladrilho, mas as horas de estudo dos jovens que vão diariamente a Neveros vão-se acumulando. Já estão na casa dos 3.000 euros e, no "sprint" final do curso, esperam reunir o dobro. Hora a hora, ladrilho a ladrilho, duas casas chegarão a ser construídas.

"Deste modo - explica Miguel Colino, coordenador da iniciativa-, além de moradias para os atingidos, consegue-se sensibilizar os estudantes com as necessidades dos outros. Vêem assim de um modo gráfico e palpável que um dos melhores modos que têm para ajudar a seus semelhantes é cumprir com o dever de cada instante; preparar-se para desempenhar com competência sua futura profissão e fazer dela um serviço aos outros".

"Já temos uma casa!", anuncia Manuel pelos corredores de Neveros. Manuel é aluno do ensino médio (15 anos) e vem ao clube de segunda a sexta. Ele viu como suas duas horas diárias de estudo servem para dar um lar a uma família, e isso deu asas a seus desejos de estudar: "Esta atividade me ajudou a levar mais a sério meu tempo de estudo", afirma. "Vejo que isto é importante e que no futuro será a ferramenta para ajudar de um modo mais direto aos países necessitados. Gosto porque o considero como uma competição. Além disso, sei que as pessoas que vêm o levam a sério".

Esta atividade solidária é mais uma dentre as que se realizaram este ano em Neveros. Os que vêm ao clube, cujas atividades de orientação cristã estão confiadas à Prelazia do Opus Dei, já têm uma certa experiência na ajuda aos outros. No Natal recolheram brinquedos pela cidade para dá-los a crianças com menos possibilidades. Semanalmente vão à residência Gotze, que acolhe a meninos com síndrome de Down. E em julho viajarão à Polônia para reabilitar um asilo de anciãos.