Vida de Maria (1): Maria pelo Magistério, Padres, santos, poetas

A Imaculada Conceição de Maria é uma realidade que ficou plasmada em textos do Magistério, dos Padres da Igreja, dos santos e dos poetas. Esta é uma seleção.

A VOZ DO MAGISTÉRIO

“Deus inefável escolheu e designou desde o princípio, antes dos tempos, uma Mãe para que seu Filho unigênito se encarnasse e nascesse dEla, na plenitude dos tempos. E em tal grau a amou, acima de todas as criaturas, que somente nEla se agradou com singular benevolência. Por isso a cumulou da abundância de todos os dons celestiais, tomados do tesouro de sua divindade, muito acima de todos os anjos e santos. E assim Ela, absolutamente sempre livre de toda mancha de pecado, toda formosa e perfeita, possui uma tal plenitude de inocência e de santidade, que não é possível conceber outra maior depois de Deus, e ninguém pode imaginar fora de Deus"

“Era certamente muitíssimo conveniente que uma Mãe tão venerável brilhasse sempre adornada com os resplendores da mais perfeita santidade, e que, imune da mancha do pecado original, alcançasse um triunfo total sobre a antiga serpente. Com efeito, Deus Pai havia disposto entregar a seu Filho unigênito – gerado de seu coração, igual a Si mesmo, e a quem ama como a Si mesmo - , de tal modo que Ele fosse, por natureza, o próprio Filho único comum de Deus Pai e da Virgem; já que o mesmo filho havia determinado fazê-la substancialmente sua Mãe, e o Espírito Santo havia querido e feito que fosse concebido e nascesse Aquele de quem Ele mesmo procede".

“Os Padres e escritores eclesiásticos, ao considerarem que a Santíssima Virgem foi chamada cheia de graça pelo anjo Gabriel – por mandato e em nome do próprio Deus – quando lhe anunciou a altíssima dignidade de Mãe de Deus (Lc 1, 28), ensinaram que, com esta saudação tão solene e singular, jamais ouvida, se manifestava que a Mãe de Deus era a sede de todas as graças divinas, e que estava adornada de todos os carismas do Espírito Santo".

“Daí deriva seu sentir, não menos claro que unânime, segundo o qual a gloriosíssima Virgem, em quem fez grandes coisas o Todo-poderoso (Lc 1, 49), brilhou com tal abundância de dons celestiais, com tanta plenitude de graças e com tal inocência, que resultou como um inefável milagre de Deus; mais, como o milagre, cume de todos os milagres e digna Mãe de Deus; e aproximando-se do próprio Deus, o mais próximo possível, de acordo com o permitido à condição de criatura, foi superior a todo louvor, tanto dos homens como dos anjos".

“Pelo que, para honra da santa e indivisa Trindade, para glória e ornato da Virgem Mãe de Deus, para exaltação da fé católica e incremento da religião cristã, com a autoridade de Nosso Senhor Jesus Cristo, com a dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo, e com a nossa, declaramos, pronunciamos e definimos que foi revelada por Deus e, por conseguinte, deve ser crida firme e constantemente por todos os fiéis a doutrina que sustenta que a Santíssima Virgem Maria foi preservada imune de toda mancha de culpa original, no primeiro instante de sua concepção, por singular graça e privilégio de Deus onipotente, em atenção aos méritos de Jesus Cristo, salvador do gênero humano".

Beato Pio IX, Bula Ineffabilis Deus, 8-XII-1854, ao definir como dogma de fé a Imaculada Conceição

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A VOZ DOS PADRES

“Exulte hoje toda a criação e estremeça de gozo a natureza. Alegre-se o céu nas alturas e as nuvens espalhem a justiça. Destilem os montes a doçura do mel e as colinas, o júbilo, porque o Senhor teve misericórdia de seu povo e nos suscitou um poderoso Salvador na casa de Davi seu servo, isto é, na imaculadíssima e puríssima Virgem, por quem chega a salvação e a expectativa dos povos".

“Que as almas boas e agradecidas entoem um cântico de alegria; que a natureza convoque todas as criaturas para anunciar-lhes a boa nova de sua renovação e o início de sua reforma. Saltem de alegria as mães, pois a que carecia de descendência (Santa Ana) gerou uma Mãe virgem e imaculada. Alegrem-se as virgens, pois uma terra, não semeada pelo homem, dará como fruto Aquele que procede do Pai sem separação, segundo um modo mais admirável de quanto se pode descrever. Aplaudam as mulheres, pois se em outros tempos uma mulher foi ocasião imprudente do pecado, também agora uma mulher nos traz as primícias da salvação; e aquela que antes foi ré, manifesta-se agora aprovada pelo juízo divino: Mãe que não conhece varão, escolhida por seu Criador, restauradora do gênero humano".

“Que todas as coisas criadas cantem e dancem de alegria, e contribuam adequadamente para este dia gozoso. Que hoje seja uma e comum a celebração do céu e da terra, e que tudo o que há neste mundo e no outro façam festa de comum acordo. Porque hoje foi criado e erigido o santuário puríssimo do Criador de todas as coisas, e a criatura preparou para o seu Autor uma hospedagem nova e apropriada".

“Hoje, a natureza, antigamente desterrada do paraíso recebe a divindade e corre com passo alegre em direção ao cume supremo da glória. Hoje, Adão oferece Maria a Deus em nosso nome, como as primícias de nossa natureza; e estas primícias, que não foram colocadas com o resto da massa, são transformadas em pão para a reparação do gênero humano."

“Hoje a humanidade, em todo o resplendor de sua nobreza imaculada, recebe o dom de sua primeira formação pelas mãos divinas e reencontra sua antiga beleza. As vergonhas do pecado haviam obscurecido o esplendor e os encantos da natureza humana; mas nasce a Mãe do Formoso por excelência, e esta natureza recobra nela seus antigos privilégios e é modelada seguindo um modelo perfeito e verdadeiramente digno de Deus. E esta formação é uma perfeita restauração; e esta restauração uma divinização; e esta, uma assimilação ao estado primitivo".

“Hoje apareceu o brilho da púrpura divina, e a miserável natureza humana revestiu-se da dignidade real. Hoje, segundo a profecia, floresceu o cetro de Davi, a rama sempre verde de Aarão, que para nós produziu Cristo, rama da força. Hoje, de Judá e de Davi, saiu uma jovem virgem, levando a marca do reino e do sacerdócio dAquele que, segundo a ordem de Melquisedeque, recebeu o sacerdócio de Aarão. Hoje, a graça, purificando o efode místico do divino sacerdócio, teceu – à maneira de símbolo – a vestimenta da semente levítica, e Deus tingiu com púrpura real o sangue de Davi".

“Para dizer tudo em uma palavra: hoje começa a reforma de nossa natureza, e o mundo envelhecido, submetido agora a uma transformação totalmente divina, recebe as primícias da segunda criação"

Santo André de Creta, Homilia I na Natividade da Santíssima Mãe de Deus.

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A VOZ DOS SANTOS

“É este um mistério de amor. A razão humana não consegue compreendê-lo. Só a fé consegue esclarecer como é que uma criatura tenha sido elevada a tão grande dignidade, a ponto de se converter no centro amoroso para o qual convergem as complacências da Trindade. Sabemos que é um segredo divino. Mas, tratando-se de Nossa Mãe, sentimo-nos capazes de entendê-lo – se é possível falar assim - mais do que outras verdades de fé."

“Os teólogos têm formulado com frequência um argumento semelhante, destinado a captar de algum modo o sentido desse cúmulo de graças de que Maria se encontra revestida e que culmina com a sua Assunção aos céus. Dizem: Convinha; Deus podia fazê-lo; portanto, assim o fez. É a explicação mais clara da razão pela qual o Senhor concedeu à sua Mãe todos os privilégios, desde o primeiro instante da sua conceição imaculada. Ficou livre do poder de Satanás; é formosa – tota pulchra! – limpa, pura na alma e no corpo". (São Josemaria, É Cristo que passa, n. 171).

“Como gostam os homens de que lhes recordem o seu parentesco com personagens da literatura, da política, do exército, da Igreja!... – Canta diante da Virgem Imaculada, recordando-lhe: Ave, Maria, filha de Deus Pai; Ave, Maria, Mãe de Deus Filho; Ave, Maria, Esposa de Deus Espírito Santo... Mais do que tu, só Deus!". (São Josemaria, Caminho, n. 496).

“Talvez agora um ou outro de vós possa pensar que a jornada comum, o habitual vaivém da nossa vida, não se presta muito a manter o coração numa criatura tão pura como Nossa Senhora. Eu vos convidaria a refletir um pouco. O que é que procuramos sempre, mesmo sem especial atenção, em tudo o que fazemos? Quando nos deixamos conduzir pelo amor de Deus e trabalhamos com intenção reta, procuramos o que é bom, limpo, aquilo que traz a paz à consciência e felicidade à alma. Será que não nos faltam erros? Claro que não. Mas precisamente reconhecer esses erros é descobrir com maior clareza que a nossa meta é essa: uma felicidade não passageira, mas profunda, serena, humana e sobrenatural".

“Uma criatura existe que conseguiu nesta terra essa felicidade, porque é a obra-prima de Deus: nossa Mãe Santíssima, Maria. Ela vive e nos protege; está junto do Pai e do Filho e do Espírito Santo, em corpo e alma. É a mesma que nasceu na Palestina, que se entregou ao Senhor desde menina, que recebeu a Anunciação do Arcanjo Gabriel, que deu à luz Nosso Salvador, que esteve junto dEle ao pé da Cruz".

“Nela adquirem realidade todos os ideais. Mas não devemos concluir que a sua sublimidade e grandeza no-la apresentam inacessível e distante. É a cheia de graça, a soma de todas as perfeições; e é Mãe. Com seu poder diante de Deus, alcançar-nos-á o que lhe pedirmos; como Mãe, no-lo quer conceder. E também como Mãe entende e compreende as nossas fraquezas, alenta, desculpa, facilita o caminho, tem sempre o remédio preparado, mesmo quando parece que já nada é possível". (São Josemaria, Amigos de Deus, n.292).

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A VOZ DOS POETAS

Tu, que aquilo que perdeu Eva,

recuperaste por seres quem és;

tu que nos deste a nova

de perduráveis prazeres;

tu, bendita entre as mulheres,

se nos acodes:

darás fim aos nossos males.

Tu, que te chamam bendita

todas as gerações;

tu, que estás por isso escrita

entre todas as nações;

pois nas tribulações

tanto vales:

dá remédio a nossos males.

Tu, que tens por ofício

consolar desconsolados;

tu, que gastas teus esforços

em livrar-nos dos pecados;

tu, que guias os errados

e os acodes:

dá remédio a nossos males.

Tu, que por fé cremos

ser de tanta perfeição,

que nunca haverá outra

de tua condição;

pois para a salvação

tanto vales:

dá remédio a nossos males.

Quem poderá tanto louvar-te

segundo é teu merecer;

quem saberá tão bem louvar-te

que não lhe falte saber;

pois que para nos valer tanto vales:

dá remédio a nossos males.

Oh Mãe de Deus e homem!

Oh concerto de concórdia!,

tu que tens por renome

mãe de misericórdia;

pois para impedir discórdia

tanto vales:

dá remédio a nossos males.

Tu, que por tão grande humildade

foste tão alto elevada,

que ao lado da Trindade

tu só estas sentada;

e tu pois, Rainha sagrada,

tanto vales:

dá remédio a nossos males.

Tu, que estavas já criada

quando o mundo foi criado;

tu, que estavas bem guardada

para quem de ti nasceu;

pois por ti nos conheceu,

si nos vales:

fenecerão nossos males.

Tu, que és flor das flores,

tu que do Céu és porta,

tu que és olor de olores,

tu que dás glória muito certa;

se da morte muito morta

não nos vales;

não há remédio em nossos males.

Juan del Enzina, Villancico.